Sob Pressão



Eu sou ouvinte e telespectador de programas esportivos, pois torço para o América de São José do Rio Preto e não perco as informações do meu time do coração. É mentira, confesso. Que diferença faz a minha mentira, se o jornalismo esportivo é pautado por boatos e meias verdades como recurso para “dar o furo” (notícia exclusiva)?

Quando se quer soltar um boato, a tática é simples: é só abusar do gerúndio e do condicional, dizendo algo muito vago, tipo “uma fonte garantida me informou que uma pessoa ligada a um diretor que ouviu do presidente do clube tal que fulano estaria sendo contratado por um grupo de empresários interessados em investir...” Usando essas generalidades, pode-se inventar qualquer bobagem, seja da vida profissional ou pessoal do jogador.

Esses programas, que tentam fazer do futebol uma novela, têm as seguintes características e tipos: sensacionalismo, torcedor de time pequeno, 4 cantos e estudante de jornalismo.

- Sensacionalismo: o tom de voz do apresentador tem que ser como o daquele antigo vendedor, na porta da sua casa, tentando convencê-lo a comprar uma coleção completa de enciclopédia, numa manhã de domingo. Os boatos são pronunciados, bem como seus respectivos GCs (gerador de caracteres: texto na parte inferior do vídeo), com interrogações e exclamações. Exemplo: Seedorf vem para o Corinthians???; Neymar fecha com Real Madrid!!!

Os sensacionalistas anunciam as supostas informações como notícia bombástica, polêmica ou furo e cravam como certas transações de jogadores que nunca se concretizam. O Neymar, do Santos, segundo os sensacionalistas, teria (eu disse, teria) acertado com o Real Madrid e Barcelona algumas vezes. Ninguém acertou o chute. Entretanto, não tenho dúvida que em 2014, depois da Copa, muitos acertarão e dirão “eu falei!”.

- Tem os torcedores de time pequeno, tipo Portuguesa, Juventus, Ponte Preta, Marília etc. Para não contrariarem parte da audiência, se escondem atrás da bandeira de equipes que não têm rejeição. Faça-se justiça aos que declaram o time que torcem, isso dá credibilidade.

- Um tipinho pernicioso e covarde é o 4 cantos. Se o futebolista não está presente, o 4 cantos desce a lenha e pede a cabeça; porém, se o atleta ou técnico está na bancada da “mesa redonda”, merece a Seleção.

Esse pseudojornalista gosta mesmo é de fofoca e maledicência. É comum, na saída de campo, ele fazer o leva-e-traz, perguntando ao atleta do time A o que ele acha do que o atleta do time B falou dele. A pergunta vem, lógico, bem embalada com a tal polêmica e a devida interpretação e inflexão de voz provocativa. Se o jogador cair nessa e polemizar, estão prontas as manchetes e GCs da segunda-feira.


- O estudante de jornalismo não é necessariamente um debutante na profissão, mas faz a cobertura esportiva como quem apresenta um trabalho no segundo período do curso de Jornalismo. Esse tipo não faz mal a ninguém, é até bonzinho, inofensivo.

A metáfora e a comparação são a grande, digamos, “sacada” para ele. Esse repórter, muitas vezes, se mete em lugares exóticos e inóspitos para mostrar, vá lá, o outro lado do futebol. Aí somos brindados com belas pérolas como: uma panela de pressão, para ilustrar, por assim dizer, que um técnico está pressionado; uma panela com uma hipercalórica feijoada, para representar que um time pode ter uma indigestão, se o placar for adverso; ou um caminho esburacado e cheio de pedras, para indicar que o percurso para o título será difícil. Sacou? Hein, hein! Chega? Então, tá. Eu me divirto com essas reportagens, principalmente quando o repórter faz a entonação e a expressão de quem imagina que a matéria ganhará o prêmio Pulitzer.

O Marco Bianchi tem material para muita paródia. E nem precisa da sua fonte em Águas de Lindóia.

Postagens mais visitadas deste blog

Inseto Insípido - Letra: Rafael da Silva Claro (1996) ▪️

Canetada

Operação gambiarra