Canção Triste 🔵

 




A canção mais triste que existe se chama “Tra lá lá lá oh”. O título é enganoso, porque sugere que vem algo alegre. Mas trata-se do acontecimento mais deprimente transformado em música. Eu já ouvi letras de abandono, de assassinatos, de todos os naipes de tragédias amorosas e familiares, mas isso foi um desastre ecológico - que faria Greta Thunberg e Leonardo DiCaprio chorarem no banheiro deitados em posição fetal. As crianças, inocentes, não só ouviam, como eram obrigadas a cantar a calamidade pública. Tudo isso em tenra idade, no pré-primário.


A letra era isso:


As flores já não crescem mais,

Até o alecrim murchou,

O sapo se mandou,

O lambari morreu,

Porque o ribeirão secou!


Na época, o agronegócio era um sonho, e a transposição do Rio São Francisco, quase  impossível. Deu no que deu! Essa catástrofe da fauna e da flora consistiu em: 


▪️uma flor (que serve como tempero) que não vingou, por falta de água;

▪️o sapo, como um gato mal alimentado, pulou, literalmente, para um local úmido;

▪️o lambari nunca tem sorte. O peixe não voa, não pula, não anda e não rasteja. Como nada, sem água morre. O infeliz pereceu. 


O “tra lá lá lá oh” do título e do início é só um chamariz. A musiquinha parece mais um  instrumento lúdico para educar, mas se revela um embuste. É só um estratagema, bem sei, para apresentar a vida real. Apresentado à dura realidade da existência, deixei de crer que a vida consistia em: recreio; minha lancheira com suco de laranja, pão com mortadela e Lanche Mirabel e um cercadinho de areia.


Tudo isso aconteceu porque o ribeirão secou! Botar a culpa em quem? Essa “desgraceira” ocorreu antes do falatório do buraco na camada de ozônio, do documentário do Al Gore, do aquecimento global, das mudanças climáticas (que referem-se a tudo), dos incêndios na Amazônia e no Pantanal, de Emmanuel Macron, da Angela Merkel etc. Naquele tempo, não tinha graça. Não tinha um ministro do meio ambiente bolsonarista para culpar.


O cataclismo, de proporções indissociáveis da ação humana, é meu testemunho de tortura psicológica infantil. Obrigar alguém (na infância) a ouvir e, pior, cantar uma canção com letra mais trágica que Chico Mineiro, só é comparável a ouvir, ou cantar, Sertanejo Universitário em qualquer época.

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