Mito Mito Mito


É rara a oportunidade de vermos a História acontecendo e sendo escrita na nossa frente. E isso está ocorrendo. Está sendo forjado um mito nacional que  ocupará os livros do futuro.
Havia uma narrativa pronta, faltava a figura imbuída dos “valores” e das dores do mundo. Existia uma farda repleta de medalhas e condecorações, Marielle Franco, involuntariamente, vestiu essa farda sob medida, in memoriam.

Marielle veio com um “combo” atribuído às minorias que poucos possuem. Talvez, nem ela utilizasse isso dessa forma, como um capital político. O fato é que encontraram uma mártir completa: mulher, negra, oriunda da favela e homossexual. Isso tudo, já seria suficiente, entretanto, o timing era propício para colar todos os atributos que estavam à espera de tão perfeita personagem. Ela não sentiria o peso de tamanha responsabilidade, e o povão, que não a conhecia, abraçaria tão apaixonante figura. 

Defensora das minorias, isso é tão abstrato, vago mesmo. Mas essas minorias não se sentem representadas por políticos. Como imagem, ficou perfeita, uma representante, legitimamente eleita, caminhando em câmera lenta, na busca de seus direitos (e um ângulo perfeito). A imagem é de campanha política, mas quem se importa.

A vereadora, do Rio de Janeiro, teve todos os trâmites burocráticos dispensados para a sua beatificação e canonização. Ela foi conduzida de venerável a santa, em tempo recorde. A partir daí, era  só espalhar a boa nova e esperar a veneração universal.

A vereadora do PSOL virou nome de rua, pintaram seu rosto, como um Che Guevara, vislumbrando um futuro melhor, que viria com a Revolução. Malala Yousafzai, de origem paquistanesa, foi orientada a homenagear a mártir. Músicos, em shows, são oportunamente assessorados a citar Marielle. Essa citação pega bem, dá uma moral, porque dá a impressão de que o gringo está antenado e se importa com as causas do terceiro mundo. Há algum tempo, ela batizou uma praça, logo ali, na França.

Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes, também sofreu um processo de “canonização”. Na incipiente República, era necessário apagar vestígios do Império e seus heróis. Acharam um carinha que no século XVIII morreu por uma causa. “Rei morto, rei posto”, eis um mártir. Faltava-lhe um aspecto meio... crístico. O alferes percorreu, entre a cadeia e o local de sua execução, uma espécie de via-crúcis. Pintaram-no com barba e cabelo compridos e vestes que emulavam Jesus. Tiradentes virou nome de rua, praça, cidade, feriado, estação do Metrô etc.

Marielle segue a mesma trajetória, com a diferença de já ter sido santificada. Depois de uns 200 anos de sua trágica morte, ela será “vendida”, ainda mais, nos livros, como uma heroína e, quem sabe, ensejará mais um feriado. Os grandes vultos são construídos com a distância do tempo, e nunca são descritos como, de fato, viveram, mas com a narrativa que atenda às  conveniências do momento. Marielle é um mito.





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