🔵 Cão

 


Saltitante, trotando como um puro sangue, vinha ele. Pelo negro brilhante e uma mancha branca espalhada pelo peito e as quatro perninhas compridas. Trazia uma característica respeitosa na mandíbula comprida. Merecia um nome nobre: Duque, talvez. Contudo, sua aparência inspirou, ironicamente, a abreviação do terrível pitbull. Como de costume, mas franqueando algum respeito, chamava-o de cão.


Empertigado, pelagem brilhante, mandíbula proeminente, ossatura firme, porte esbelto, um legítimo Fox Paulistinha. Seria assim que o Pit se descreveria se tivesse o dom da fala; eu também exageraria descrevendo os seus atributos se ele fosse inscrito num torneio do Kennel Club. No entanto, o meu cãozinho trazia um rato morto na boca e, pelo que eu saiba, capturar roedores não garante nenhum brinde no Kennel Club. 


Se passeasse com o pequeno cão, sei que não poderia fingir que éramos uma dupla muito perigosa (eu, lutador de jiu-jítsu e ele, um pitbull), por isso, só tinha coragem de levá-lo para tomar vacina contra a raiva, em agosto.


Pit caçava ratos e exibia-os como se alguém admirasse essa sua habilidade. Não bastasse a ausência de higiene, o animal fazia questão de mostrar o resultado de sua busca em qualquer ocasião, inclusive na hora do almoço. Sua única habilidade apreciada — embora repetida por qualquer vira-lata velho e zuado — era pegar bolinhas. Ele apenas cessava quando eu parava de chutar as esferas; pela sua incrível frequência cardíaca, tenho certeza que só desistiria quando caísse morto.


Ele não seria útil perante um cão perdigueiro ou um cão pastor. Ele não vinha de uma raça famosa como um dálmata, a Lassie, o Snoopy, o Benji, o Scooby-Doo, o Marley etc. Ele não era um bicho feroz e temido como um dobermann, um fila, um rottweiler ou um, novamente, pitbull.


Não foi nenhum animal premiado, não possuía habilidades especiais, não fazia truques e não era um bom guarda. Entretanto, era um ótimo companheiro. A maior habilidade dele era mostrar qualidades humanas. O grande truque dele viria no ato final: saudades...


O coraçãozinho do Pit parou. Não foi apanhando ratos, nem bolas. 

Postagens mais visitadas deste blog

Inseto Insípido - Letra: Rafael da Silva Claro (1996) ▪️

Canetada

Operação gambiarra