🔵 A Praça do Pôr do Sol

 




Saindo da FNAC Pinheiros, cinco da tarde, no inverno o Sol se escondia às cinco e vinte. Sábado, só sairia umas dez da noite, então não custaria me infiltrar entre uma turma que abraça árvores e aplaude o pôr do sol. 


Não seria novidade, para quem passou a tarde entre uma “galerinha natureba” que acha que vai salvar o planeta e a si bebendo suco detox, usando canudo de papel, usando copo reutilizável, construindo móveis com madeira de reúso, armazenando água da chuva e reciclando lixo, mas queimando diesel. Para completar minha inserção no universo “esquerda de IPhone” e elevar meu ranking de “bichogrilisse” ao máximo, fugi, sem sucesso, das onipresentes “contações de histórias”. Eu fui à FNAC sabendo que de sábado era, infalivelmente, assim. A livraria ficava muito perto da Vila Madalena, portanto sabia onde eu estava pisando.


Cheguei a pé à Praça Cel. Custódio Fernandes Pinheiro. Tá, Praça do Pôr do Sol, no Alto de Pinheiros. O lugar ganhou esse nome, porque é um dos raros locais agradáveis, em São Paulo, onde se pode acompanhar a fuga da bola de fogo até a última borda.


Não deu outra, em meio à “selva de pedra”, o corre-corre, o trânsito, as cracolândias e “a força da grana que ergue e destrói coisas belas”, aquele bando de gente aplaudia efusivamente — aos gritos de “ú-hú” — o pontual espetáculo da natureza que resolvia embasbacar diariamente os paulistanos para lembrar quem é que manda.


Depois da concessão à natureza, após lembrar o que há além dos apartamentos, dos automóveis, dos eletrodomésticos, dos eletroeletrônicos, enfim, das facilidades do dia a dia, todos voltam à rotina da cidade grande. A Praça do Pôr do Sol é só uma lembrança.


A Praça do Pôr do Sol está muito popular. Eu comecei a frequentar ali quando ainda era agradável, parei de ir ali quando um arranha-céu cobriu a réstia dos raios solares que brigavam com o vento gelado e a Praça ficou tão popular que a frequência e a sujeira transformaram o tranquilo e limpo local numa filial da Cracolândia.

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