🔵 A revolução dos bixos

 



Resolvi começar mais uma faculdade. Sempre tomando o devido cuidado para não virar aquela piadinha besta do pedreiro que fez cinco faculdades e ía começar mais uma. A decisão era séria, entretanto desta vez os objetivos eram alguns: dar um “upgrade” na minha formação intelectual, bem como obter um diploma para pendurar no lugar do diplominha da escolinha infantil. O principal era que, com o terceiro grau completo, eu poderia prestar um concurso público mais robusto.


Ingressei numa dessas universidades “shopping center”, conhecidas como “pagou, passou” ou, ainda, prédios escolares que, distribuindo canudos, despejaram caixas de supermercados advogados e balconistas administradores de empresas. 


Nosso quadro docente contava com uma equipe pronta para formar uma guerrilha urbana e a luta armada, almejando, eternamente, a “ditadura do proletariado”. Para não sobrar dúvidas, um professor chamava-se Vladimir. Como eu não tinha talento para disfarçar que era capitalista e, além disso, conservador, só continuei o curso porque Vladimir (logo ele!) me deu cobertura e garantiu minha vida enquanto não instalassem o paredão. Descartando a possibilidade de me tornar um marxista, tratei de autopoliciar o emprego das palavras. Sem o estereótipo das classes trabalhadoras, menos favorecidas, minorias ou coletivos, logo vi que eu estava em território inóspito. Portanto, enfrentaria anos difíceis.


Mas, descobri, eu não era o único direitista infiltrado naquele ambiente socialista. O curso de Letras e os descontos atraíram um “enxame” de policiais civis e militares com o objetivo de ingressar na Polícia Federal. Um pouco de tirocínio identificava a ideologia dos indivíduos (professores e alunos).


A profissão da maioria dos calouros intimidava a aproximação dos veteranos e seus trotes. Nós, os calouros, passeávamos pelo “templo do conhecimento” espantando quaisquer ameaças de trote e, até eu evadir-me de mais uma faculdade, do trote. Enfim, consegui dissuadir a ameaça de perseguição dos malditos comunistas.


Me sentindo um veterano já no primeiro dia e incólume à doutrinação escolar, senti-me livre para acessar os gráficos da Bolsa de Valores e outros ícones da burguesia. Naquele momento, me senti incólume às lesões cognitivas causadas pela leitura de Jean-Jacques Rousseau e Michel Foucault, bem como militantes disfarçados de professores implementando sua tática gramsciana. Minhas credenciais garantiam que ninguém se aproximaria de mim me chamando de companheiro. 


Eu nunca tive vocação para me fazer de oprimido, muito menos “posar” de vítima da suposta classe opressora. A utopia socialista jamais me usaria de massa  de manobra. O Diretório Acadêmico, naquele ano, garantiria uma fornada de idiotas úteis voluntários. As expectativas iniciais tornavam tinta na cara e um corte mal feito no cabelo os menores dos males. 













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