🔵 Colheita maldita

 



Não é recomendável nenhum jeito para se começar a fumar, entretanto eu descobri na prática como não se deve tentar aprender. Pensando bem, é possível que essa experiência tenha afastado toda a tendência de viver viciado em tabaco.


Foi numa cidadezinha nas montanhas do Rio Grande do Sul. É um perigo passar as férias, com um moleque de 14 anos, numa fazenda com plantação de fumo. Parece óbvio que, com a curiosidade intrínseca à idade, o pirralho quererá consumir o produto “in natura”.


Um garoto da cidade vivendo o turismo rural e com uma farta oferta de entorpecente era uma combinação explosiva. O que antes eu apenas presenciara nos caixas de padarias, agora poderia ser calculado em hectares.


Ah, as belezas da natureza e as delícias da fazenda! Contudo o perigo estava lá, dia e noite, plantado, defumando, me provocando quando desfila num carro de boi. Mas chegaria a hora em que eu e a matéria-prima da Souza Cruz nos encontraríamos.


Certo dia, cansado da rotina do campo a ponto de sentir saudade do prédio da Fiesp, depois de cortar lenha a machadadas, eu e meu amigo resolvemos visitar as folhas de fumo que descansavam no defumador. No nosso mal-formado juízo, o produto já estava pronto para consumo. 


Abrindo aquele cômodo, foi legal ver aquelas folhas, que recheariam os cigarros, enfileiradas. Confesso que eu ainda preferiria encontrar aquela salinha cheia de biscoitos São Luiz. Mas era chegado o momento de eu virar um “adulto” na marra. Ter ido passar as férias cercado por um latifúndio de tabaco, só  poderia ser um sinal do destino!


Escolhemos o vegetal, enrolamos e acendemos o “charuto”. Que mal poderia fazer se era uma erva natural? Traguei como o cowboy da  Marlboro, e tossi como eu mesmo. Abruptamente, voltei a realidade e, achando a erva muito amarga e tóxica, comecei a achar o chimarrão palatável. 


O que tinha tudo pra ser um rito de passagem perfeito, marcando exatamente o final da infância e o início da vida adulta, foi um episódio traumático. Depois, vim a saber que nenhuma forma de aprender a fumar é interessante. Talvez, a terrível aventura tenha servido para encerrar a curiosidade. Ah, eu continuei viciado em biscoitos São Luiz.


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