🔵 Diversões eletrônicas

 



Entrei naquele cenário que era a descrição mais perfeita do que sempre classifiquei como “inferninho”. A descrição é desoladora: um bando de desocupados e escravos do vício. Entregues ao álcool e ao tabaco, largavam latas vazias e bitucas ou tocos de cigarros semi consumidos.


Fora outras cenas incompreensíveis, era esse o panorama encontrado no “fliperama” Colorado. Esse “inferninho” provavelmente abrigava o que havia de pior e mais desolador na sociedade oitentista.


Revelando a desesperança de mais de vinte anos de governo militar, aquela juventude gastava o seu tempo e algum dinheiro num “fliperama” imundo, entretendo e esquecendo a monotonia, entre máquinas de diversões eletrônicas. 


Distraindo pessoas escondidas no concreto impessoal da Grande São Paulo, restavam as companhias do Pac-man, Rally-X, Cavaleiro Negro, Shark... Prevendo que alguém que se divertia com seres pixelizados ou uma esfera doida precisavam de entorpecentes, as máquinas vinham equipadas com cinzeiros. Variando entre “arcades” e “pimballs”, a juventude da incipiente “década perdida. gastava tempo,  fichas e o troco do pão com a “brincadeira viciante”.


Somente a idade contada em algarismos unitários pode explicar o impacto daquele panorama, bem como a atual idade pode produzir uma reflexão mais aprofundada do que significava aquilo.


Esse hábito — ou melhor, esse vício — se estendeu por outros CEPs; em cada cidade, a localização do “fliperama” tinha a mesma prioridade que a sorveteria. Essa febre se esgotou, felizmente, no Atari. Apesar de eu não substituir o futebol na rua pelo joguinho eletrônico, gastei algumas tardes esfarelando o “joystick” inconfundível do disruptivo videogame. 


A máquina preta que “estraga as vista” virou febre em 1983, e (sabe-se lá em quantas parcelas) meus pais conseguiram obter um exemplar do revolucionário brinquedo. O objeto que veio da falecida Mesbla mudou os hábitos da casa: em horários inimagináveis, sempre havia uma alma insone sentada diante do console. “Flashs” estroboscópicos e tiros vindo da sala preenchiam a escuridão. Sem saber, meus pais recuperaram um menor hipnotizado pelas luzes coloridas do Colorado.


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